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sexta-feira, 24 de julho de 2015

Tudo o que você pensa saber sobre adicção é errado.





Quase tudo o que pensamos saber sobre o vício está errado e se começarmos a absorver as novas provas sobre ele, acredito que nós vamos ter que mudar muito mais do que as nossas políticas de drogas.

Imagine que três vezes ao dia durante vinte dias você fizesse uso de heroína. O que aconteceria? Temos uma história sobre o que iria acontecer que nos foi dito por um século. Nós pensamos que porque existem ganchos químicos em heroína, seu corpo se tornaria dependente e você começaria a precisar deles fisicamente e no final desses 20 dias, você teria se tornado um viciado em heroína. Certo? Isso foi o que eu pensei. Mas e quando as pessoas ficam hospitalizadas por um longo período fazendo uso de diamorfina que é heroína em estado puro, por que quando recebem alta não se tornam dependentes?

O professor de psicologia em Vancouver Bruce Alexander realizou um experimento que realmente nos ajuda a entender esta questão. Ele colocou um camundongo em uma gaiola com duas fontes de água, uma em estado puro, outra misturada com heroína ou cocaína e o animal quase sempre preferiu a água alterada vindo a morrer rapidamente.

Mas o pesquisador observou que colocou o animal em uma gaiola vazia sem nada para fazer exceto usar drogas e se propôs a fazer algo diferente: construiu uma gaiola que nomeou “parque de rato” onde eles tinham queijo, um monte de bolas coloridas, túneis, um monte de amigos e sexo.

Nessa gaiola os camundongos também foram expostos a ambas fontes de água (normal e drogada), mas aqui o resultado é fascinante: no “parque de ratos”  eles não gostam da água com  drogas, eles quase nunca a usam, nenhum deles jamais a usou compulsivamente, nenhum deles jamais  teve overdose. Você vai de quase 100% de overdose quando eles estão isolados para 0% de overdose quando têm vidas felizes e conectadas.

Tais resultados se repetiram quando observados os retornos dos soldados da guerra do Vietnan de cuja tropa, 20% fazia uso de heroína. Tais soldados acompanhados nos retornos aos seus lares e desses, 95% sem passar por nenhuma espécie de reabilitação, simplesmente parou o uso, não se tornaram adictos.

Nesse contexto o pesquisador questiona-se: e se o vício não for causado pelas conexões químicas que ocorrem durante o uso prolongado da substância? E se o vício for uma resposta adaptativa ao meio ambiente?

O professor Peter Cohen na Holanda propõe que talvez não devêssemos chamar vício e sim ligação. Os seres humanos têm uma necessidade natural e inata de ligação e quando estamos felizes e saudáveis, nós vamos ligar e se conectar uns com os outros, mas se você não pode fazer isso, porque você está traumatizado ou isolado, ou abatido por vida, você vai se relacionar com algo que vai lhe dar alguma sensação de alívio. Agora, isso pode ser o jogo, a pornografia, a cocaína ou a maconha, mas você vai se relacionar e se conectar com alguma coisa, porque essa é a nossa natureza, isso é o que queremos como seres humanos.

Uma parte essencial da dependência diz respeito sobre o dependente não ser capaz de suportar estar presente em sua própria vida e ao invés de ofertar um suporte à eles, nós os punimos, envergonhamos e lhes damos registros criminais, colocamos barreiras para que eles possam se reconectar e o que devemos fazer é justamente o oposto, a mensagem a ser passada é:  você não está sozinho, nós amamos você.

Esse modo de resposta deve se dá em todos os níveis: social, político e individualmente.  Por 100 anos estivemos cantando canções de guerra sobre viciados, penso que ao longo desse tempo deveríamos ter cantado canções de amor para eles, porque o oposto do vício não é a sobriedade, o oposto do vício é conexão. 



terça-feira, 30 de junho de 2015

Mazzeo e a mídia





Na sociedade capitalista, os meios de comunicação, em sua maioria, constituem monopólios de informação e, consequentemente, de manipulação ideológica porque veiculam sempre as "informações" sob o enfoque hegemônico das classes dominantes e, por conseguinte, da ideologia dominante, influindo e moldando negativamente a subjetividade das pessoas, dificultando a formação de uma consciência crítica em relação à própria sociedade e às suas contradições.
                                                                             
Daí é fundamental para o aprofundamento da democracia a desmonopolização da informação, ou melhor dizendo, o controle social da informação e do acesso aos meios de comunicação. No caso brasileiro, isso é notório, já que temos os meios de comunicação nas mãos de algumas famílias que autocraticamente se apropriaram da informação.

Para fazermos avançar a democratização da informação, temos que pensar em novas formas político-sociais que permitam o amplo acesso dos movimentos sociais, sindicatos, universidades e escolas públicas, etc. às rádios e TVs, assim como construir emissoras de rádio e de televisão sob controle do conjunto da sociedade. Em meu modo de entender, a democratização da informação somente será possível com uma forte e organizada pressão da sociedade.

Antonio Carlos Mazzeo


quinta-feira, 16 de abril de 2015

Da Liberdade em sociedade



Os direitos e as liberdades não são inerentes ao homem como tal... Foi a sociedade que consagrou o indivíduo e o tornou eminentemente digno de respeito. A sua emancipação progressiva não implica um enfraquecimento, mas antes uma transformação dos laços sociais... O indivíduo submete-se à sociedade, e essa submissão é a condição da sua libertação.
A liberdade consiste, para o homem, na sua libertação das forças físicas, cegas e irracionais; consegue-o opondo-lhes a grande força inteligente que é a sociedade, sob cuja proteção se acolhe. Colocando-se sob a proteção da sociedade, torna-se também ele, até certo ponto, dependente dela. Mas esta dependência é libertadora.
Constitui, pois, um erro básico acreditar que a autoridade moral e a liberdade opõem e se excluem mutuamente; uma vez que o homem só obtém a liberdade de que goza devido ao fato de ser membro da sociedade, tem de se sujeitar à autoridade moral que a existência da sociedade pressupõe. Isto não constitui um paradoxo, pois ser livre não é fazer o que nos agrada, é sermos senhores de nós mesmos.
A disciplina, no sentido do controle interior dos próprios impulsos, é uma componente essencial de todas as regras morais. A perspectiva que equipara inerentemente a disciplina a uma limitação da liberdade humana e da auto-realização do homem é errônea. Não há nenhuma forma de organização da vida que não obedeça a princípios regulares e bem definidos; o mesmo acontece em relação à vida social.
A sociedade é uma organização das relações sociais, implicando, portanto uma regulamentação do comportamento de acordo com os princípios estabelecidos, que na sociedade são obrigatoriamente as regras morais. Só a aceitação da regulamentação torna possível a vida social, permitindo ao homem colher os benefícios que a sociedade lhe faculta. 

Durkheim em Capitalismo e a Moderna Teoria Social de Anthony Giddens (p.170-171).


quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

As Paixões da Alma



"As maiores almas são capazes dos maiores vícios, como também das maiores virtudes".

Art.148. O exercício da virtude é um excelente remédio contra as paixões.
Se bem que essas emoções inferiores nos atinjam mais de perto e possuam, consequentemente, muito mais poder sobre nós do que as paixões que se encontram com elas, e das quais diferem, é certo que, uma vez que a alma tenha sempre do que se contentar em seu íntimo, todas as perturbações que provêm de outras partes não dispõem de poder algum para prejudicá-la; mas antes servem para aumentar a sua alegria, pelo fato de, vendo que não pode ser por eles ofendida,  conhece com isso sua própria perfeição. E, para que a nossa alma tenha por que estar contente, necessita somente seguir estritamente a virtude. Pois, quem quer que tenha vivido de tal forma que sua consciência não possa censurá-lo de jamais haver deixado de fazer todas as coisas que reputou serem as melhores (que é o que denomino aqui seguir a virtude), recebe daí uma satisfação tão intensa para torná-lo feliz que os mais veementes esforços da paixão jamais têm poder suficiente para perturbar a tranquilidade de sua alma.

Art.152. Por que motivo podemos estimar-nos.
Posto que uma das principais partes da sabedoria é saber de que maneira e por que motivo cada pessoa deve estimar-se ou desprezar-se, exporei aqui minha opinião. Percebo em nós somente uma coisa que possa nos fornecer a justa razão de nos estimarmos, que é a utilização de nosso livre-arbítrio e o domínio que possuímos sobre as nossas vontades; pois é apenas pelas ações que dependem desse livre-arbítrio que podemos com razão ser elogiados ou reprovados, e ele nos torna de algum modo semelhantes a Deus, fazendo-nos senhores de nós mesmos, desde que não abdiquemos, por covardia, dos direitos que ele nos outorga.
[...] Se evito exprimir meu juízo a respeito de uma coisa, quando não a concebo com bastante clareza e distinção, é evidente que o emprego muito bem e que não estou equivocado; porém, se decido negá-la ou afirmá-la, então não emprego como devo meu livre-arbítrio; se garanto o que não é verdadeiro, é evidente que me equivoco, e mesmo que julgue de acordo com a verdade, isto não acontece, a não ser por acaso e eu não deixo de errar e de empregar mal meu livre-arbítrio; pois a razão nos ensina que o conhecimento do entendimento deve sempre vir antes da determinação da vontade.
Descartes em As Paixões da Alma


quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Dos Desejos: prazer e dor.




Consideremos também que, dentre os desejos, há os que são naturais e os que são inúteis; dentre os naturais, há uns que são necessários e outros, apenas naturais; dentre os necessários, há alguns que são fundamentais para a felicidade, outros, para o bem-estar corporal, outros, ainda, para a própria vida. E o conhecimento seguro dos desejos leva a direcionar toda escolha e toda recusa para a saúde do corpo e para a serenidade do espírito, visto que esta é a finalidade da vida feliz: em razão desse fim praticamos todas as nossas ações, para nos afastarmos da dor e do medo.

Embora o prazer seja nosso bem primeiro e inato, nem por isso escolhemos qualquer prazer: há ocasiões em que evitamos muitos prazeres, quando deles nos advêm efeitos o mais das vezes desagradáveis; ao passo que consideramos muitos sofrimentos preferíveis aos prazeres, se um prazer maior advier depois de suportarmos essas dores por muito tempo. Portanto, todo prazer constitui um bem por sua própria natureza; não obstante isso, nem todos são escolhidos; do mesmo modo, toda dor é um mal, mas nem todas devem ser sempre evitadas.

 Convém, portanto, avaliar todos os prazeres e sofrimentos de acordo com o critério dos benefícios e dos danos. Há ocasiões em que utilizamos um bem como se fosse um mal e, ao contrário, um mal como se fosse um bem. Consideramos ainda a auto-suficiência um grande bem; não que devamos nos satisfazer com pouco, mas para nos contentarmos com esse pouco caso não tenhamos o muito, honestamente convencidos de que desfrutam melhor a abundância os que menos dependem dela; tudo o que é natural é fácil de conseguir; difícil é tudo o que é inútil.

Os alimentos mais simples proporcionam o mesmo prazer que as iguarias mais requintadas, desde que se remova a dor provocada pela falta: pão e água produzem o prazer mais profundo quando ingeridos por quem deles necessita. Habituar-se às coisas simples, a um modo de vida não luxuoso, portanto, não só é conveniente para a saúde, como ainda proporciona ao homem os meios para enfrentar corajosamente as adversidades da vida: nos períodos em que conseguimos levar uma existência rica, predispõe o nosso ânimo para melhor aproveitá-la, e nos prepara para enfrentar sem temor as vicissitudes da sorte.

Quando então dizemos que o fim último é o prazer, não nos referimos aos prazeres dos intemperantes ou aos que consistem no gozo dos sentidos, como acreditam certas pessoas que ignoram o nosso pensamento, ou não concordam com ele, ou o interpretam erroneamente, mas ao prazer que é ausência de sofrimentos físicos e de perturbações da alma. Não são, pois, bebidas nem banquetes contínuos, nem a posse de mulheres e rapazes, nem o sabor dos peixes ou das outras iguarias de urna mesa farta que tomam doce uma vida, mas um exame cuidadoso que investigue as causas de toda escolha e de toda rejeição e que remova as opiniões falsas em virtude das quais uma imensa perturbação toma conta dos espíritos.

De todas essas coisas, a prudência é o princípio e o supremo bem, razão pela qual ela é mais preciosa do que a própria filosofia; é dela que originaram todas as demais virtudes; é ela que nos ensina que não existe vida feliz sem prudência, beleza e justiça, e que não existe prudência, beleza e justiça sem felicidade. Porque as virtudes estão intimamente ligadas à felicidade, e a felicidade é inseparável delas.

Epicuro em Carta sobre a felicidade (a Meneceu).
   * Obra de fácil localização na internet, tão breve como profundo.

terça-feira, 13 de maio de 2014

Da Sociedade



Se nos voltarmos para as restrições que só se aplicam a certas classes da sociedade, encontraremos um estado de coisas que é flagrante e que sempre foi reconhecido. É de esperar que essas classes subprivilegiadas invejem os privilégios das favorecidas e façam tudo o que podem para se libertarem do seu próprio excesso de privação. Onde isso não for possível, uma permanente parcela de descontentamento persistirá dentro da cultura interessada, o que pode conduzir a perigosas revoltas.
 Se, porém, uma cultura não foi além do ponto em que a satisfação de uma parte de seus participantes depende da opressão da outra parte, talvez maior - este é o caso em todas as culturas atuais-, é compreensível que as pessoas assim oprimidas desenvolvam uma intensa hostilidade para com uma cultura cuja existência elas tornam possível pelo seu trabalho, mas de cuja riqueza não possuem mais do que uma quota mínima.
Em tais condições, não é de esperar uma internalização das proibições culturais entre as pessoas oprimidas. Pelo contrário, elas não estão preparadas para reconhecer essas proibições, têm a intenção de destruir a própria cultura e se possível, até mesmo aniquilar os postulados em que se baseia. A hostilidade dessas classes para com a civilização é tão evidente, que provocou a mais latente hostilidade dos estratos sociais mais passíveis de serem desprezados. Não é preciso dizer que uma civilização que deixa insatisfeito um número tão grande de seus participantes e os impulsiona a revolta, não tem nem merece a perspectiva de uma existência duradoura.

Freud, em O Futuro de uma ilusão, Vol. XXI (1927).

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Trabalho e tédio


Buscar trabalho pelo salário- nisso quase todos os homens dos países civilizados são iguais; para eles o trabalho é um meio, não um fim em si; e por isso são pouco refinados na escolha do trabalho, desde que proporcione uma boa renda. Mas existem seres raros, que preferem morrer a trabalhar sem ter prazer no trabalho: são aqueles seletivos, difíceis de satisfazer, aos quais não serve uma boa renda, se o trabalho mesmo não for à maior de todas as rendas.
A esta rara espécie de homens pertencem os artistas e contemplativos de todo o gênero, mas também os ociosos que passam a vida a caçar em viagens, em atividades amorosas e aventuras. Todos estes querem o trabalho e a necessidade, enquanto estejam associados ao prazer, e até o mais duro e difícil trabalho, se tiver de ser. De outro modo, são de uma resoluta indolência, ainda que ela traga miséria, desonra, perigo, para a saúde e a vida.
Não é o tédio que eles tanto receiam, mas o trabalho sem prazer; necessitam mesmo de muito tédio para serem bem sucedidos no seu trabalho. Para o pensador e para todos os espíritos inventivos, o tédio é aquela desagradável “calmaria” da alma, que precede a viagem venturosa e os ventos joviais; ele tem de suportá-la; ele, tem de aguardar em si o seu efeito: - é justamente isso o que as naturezas menores não conseguem obter de si! Afastar o tédio a todo custo é vulgar: assim como é vulgar trabalhar sem prazer.
Nietzsche em A Gaia Ciência.